A Trama da Permanência: A Saga de Luis Suárez no Grêmio

O Início Promissor e a Sombra da Incertidão

A chegada de Luis Suárez ao Grêmio foi recebida com grande euforia pela torcida. Uma estreia avassaladora, com três gols, vitórias e um título gaúcho conquistado com sua participação decisiva, alimentaram a esperança dos torcedores. O uruguaio demonstrava um desempenho notável, com muita entrega em campo, raramente sendo substituído. Contudo, uma reviravolta em Miami, envolvendo seu grande amigo Lionel Messi, lançaria uma sombra de incerteza sobre sua trajetória no clube gaúcho.

A mudança de Messi para o Inter Miami, na Major League Soccer (MLS), despertou em Suárez o desejo de se juntar ao amigo, dando início a uma "novela mexicana", como descreveu o técnico Renato Portaluppi. Esse desejo e uma crescente insatisfação física do jogador iriam desencadear uma série de eventos que culminaram em uma negociação tensa.

O Desgaste Físico e o Desejo de Partida

No dia 30 de maio, o primeiro sinal de alerta soou quando Suárez relatou à comissão técnica que estava "se sentindo desgastado fisicamente". Esse foi o início de uma novela que se estenderia por 57 dias. Em 4 de junho, após uma vitória sobre o São Paulo, o jogador expressou sua dor de forma incisiva, chegando a mencionar que iria "parar de jogar". Apesar disso, ele insistiu em atuar contra o Flamengo, no Maracanã, onde, após a goleada sofrida, disse ao presidente Alberto Guerra: "No puedo más".

Essa frase intensificou a preocupação da diretoria gremista. O advogado de Suárez, Ivan Zaldua, entrou em cena, informando que seu cliente não jogaria mais, realizando apenas duas partidas adicionais. Em 20 de junho, o clube recebeu uma carta assinada por Suárez, formalizando sua intenção de rescindir o contrato, alegando desgaste no joelho direito e a necessidade de se afastar dos gramados.

A carta de Suárez, endereçada ao presidente do Grêmio , expressava: "Diante da impossibilidade de poder seguir jogando e render no futuro nas condições pelas quais fui contratado, como consequência do desgaste de meu joelho, proponho um acordo de encerramento mútuo do contrato". Na mesma carta, o jogador ainda declarava que, para não prejudicar o clube financeiramente, liberaria o uso de sua imagem até o final de 2024, sem custos adicionais.

A Complexa Negociação e a Mudança de Estratégia

A direção do Grêmio , surpreendida com a súbita intenção de rescisão de contrato, iniciou uma complexa negociação. Zaldua propôs uma "rescisão de acordo mútuo", enquanto o clube argumentava que a decisão era unilateral do atleta. O impasse levou o advogado a apresentar duas opções: o afastamento de Suárez, com o clube arcando com seu salário, ou um acordo mútuo, acompanhado de uma compensação financeira.

A situação exigiu uma reunião extraordinária do Conselho de Administração do Grêmio , onde se decidiu que o assunto seria conduzido por um comitê. O vice de futebol, Paulo Caleffi, foi afastado do caso e posteriormente demitido, devido à sua condução da crise. A partir daí, o clube adotou uma nova estratégia, buscando a permanência do jogador, mesmo que isso significasse ele não atuando e permanecendo no departamento médico.

Zaldua, representando Suárez, buscou um acordo que garantisse a liberação do jogador. As posições mudavam constantemente nas negociações. Em certos momentos, ele defendia o cumprimento do contrato, enquanto em outros, argumentava que seria mais vantajoso para o clube um acordo, evitando o pagamento de um salário para um atleta que não poderia jogar. A novela ganhou contornos ainda mais dramáticos quando o Inter Miami oficializou seu interesse em contratar o jogador.

O Acordo e a Permanência até o Fim da Temporada

Com o prazo do Inter Miami para inscrever Suárez se aproximando, Zaldua apresentou uma oferta: o jogador pagaria 7 milhões de dólares, devolveria os valores recebidos entre janeiro e junho, além de abrir mão do restante do contrato. Contudo, o clube não aceitou a proposta. A tensão aumentou quando Suárez se recusou a jogar a partida de ida das quartas de final da Copa do Brasil, alegando dores. No vestiário, o presidente Guerra afirmou que o jogador não sairia, independente de questões financeiras.

Diante da intransigência do Grêmio , Zaldua deixou de ser o representante do jogador e foi substituído por Sebastián Verdes. Com a mudança de interlocutor, o acordo que anteciparia o fim do contrato para dezembro começou a se desenhar. Sem uma data para ir aos EUA, Suárez aceitou permanecer no Grêmio até o final de 2023, um ano antes do previsto. Um acordo mútuo, sem envolver dinheiro, foi selado.

Segundo Luciano Feldens, vice-presidente do Conselho de Administração, a mudança na interlocução com o jogador foi crucial para preservar os interesses do Grêmio e chegar a um acordo. O esforço demonstrado por Suárez em campo até o final da temporada comprovou a decisão acertada. Após o acordo, Suárez fez 22 partidas, marcando 13 gols e dando 8 assistências, um desempenho notável que o consagrou como um dos melhores jogadores do campeonato brasileiro.

O Legado de Suárez e o Agradecimento Final

A passagem de Suárez pelo Grêmio , marcada por tensões e reviravoltas, deixou um legado de superação e profissionalismo. Mesmo diante das dificuldades, o jogador cumpriu a promessa feita em sua primeira coletiva: "Prometo entrega, companheirismo, atitude, garra e gols". Sua dedicação e talento foram cruciais para conduzir o Grêmio ao vice-campeonato brasileiro e garantir a vaga na Copa Libertadores.

Antes de deixar o Brasil, no mesmo vestiário do Maracanã onde havia dito "no puedo más", Suárez agradeceu ao presidente Alberto Guerra por não tê-lo deixado sair. Uma mudança de tom que refletiu a importância do clube em sua trajetória e o reconhecimento por ter cumprido seu contrato até o fim, mesmo diante de todas as adversidades.

Ao final de sua passagem, Luis Suárez deixou o Brasil com a Bola de Ouro, prêmio dado ao melhor jogador do Brasileirão, e como um dos grandes protagonistas do futebol nacional, demonstrando que mesmo em meio às turbulências, é possível construir um legado de sucesso.